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quarta-feira, 21 de março de 2012

A rejeição do outono


Primeiro dia de outono. Paro e penso em como as pessoas nem ligam para essa estação. Mas afinal, sempre tem que haver algo que é rejeitado, e com as estações não iria ser diferente , não é mesmo ?
 O verão e seu calor que aquece as emoções e nos faz agir como tolos, desesperados pela alegria que faz parte da estação, mesmo que ela muitas vezes não faça parte de nós. O inverno e seu frio que nos isola, porém conforta com a proximidade que temos das pessoas devido ao fato de nos tornarmos cada vez mais compactados conforme a sensação de frio aumenta. A primavera e suas cores... e flores, que trazem junto a harmonia de um clima agradável, saudável, que torna tudo leve e sem preocupações.
Mais agora, e o outono? O clima indefinido, as arvores literalmente peladas, fora a sujeira que fica por conta das folhas que caem, secas e sem vida. Talvez seja por essa indiscrição, essa “falta de algo” realmente especial, que o outono seja tão rejeitado assim. É deixado de lado, porque nele não há nada de especial, é só uma transição entre os extremos do verão e inverno. A primavera também é isso, porém tem suas flores que pintam um quadro mais confortável de mudança, mais bonito e por isso mais relevante.

E é aí que eu me questiono dessa importância da aparência do belo e do bonito. Do que parece ser bom, para aquilo que , no fundo só aparenta ser ruim. Vivemos em um mundo feio, sem escrúpulos, que prefere muito mais valorizar uma beleza física e material do que uma beleza que é única : a beleza da alma, aquela que modifica padrões de comportamento e que nos faz ser o que somos.


Só é atraente aquilo que é fisicamente belo, o deteriorado, o esquisito, o feio é rejeitado , por mais qualidades internas que possua. É triste concluir que as pessoas só consigam enxergar esse lado, me decepciona ver que, apesar de termos a consciência de que nada é para sempre ( inclusive a beleza) , nosso pensamento parece funcionar ao contrário dessa constatação.
 
Somos seres egoístas, que preferem ficar com aquilo que nos agrada os olhos, e manter o mais distante o possível aquilo que nos incomoda, nos trás desconforto, justamente pelo fato de sabermos que o nosso fim é sempre o mesmo...
 
É como cita Marcelo Rubens Paiva, em seu "Feliz Ano Velho", quando diz que as pessoas não estavam incomodadas com o fato de ele simplesmente ser estranho e não poder andar, estar ali, inválido em uma cadeira de rodas... elas na verdade estavam incomodadas com o aviso que ele dava á todos : que ele, apesar de jovem e belo, que aparentava ser imune como nós sempre nos achamos ser, tinha sofrido um golpe do destino, e que todos nós, inclusive aqueles que menos parecem, estamos sujeitos á esses golpes.
E é fato que nos incomodamos com essas mensagens que nos passam todos os dias. Preferimos ignora-las , trata-las com indiferença do que aceita-las com admiração. Ver que na verdade o belo se encontra nelas, porque apesar das diferenças, conseguiram resgatar o que há de melhor dentro de si para poder sobreviver. E o seu melhor com certeza não se encontrava na aparência física.
 Sinto que o “aparentemente” saudável torna-se cada vez mais doentio, mais sem vida, sem valores...sem amor.Afinal, o que é o amor? Porque isso me parece não existir mais. Existe somente uma coisa : atração física. Ponto. Admiração, valorização, amor-próprio... nada disso existe mais nas relações. E não estou querendo dizer só relações homem/mulher no sentido sexual, mais todos os tipos de relações. Ser amigo de alguém feio e estranho pega mal, então porque me aproximar, não é mesmo ?
O problema é que a verdadeira deformidade mora dentro de atitudes como essa. São as rejeições, pré-conceitos que moram dentro de nós que nos fazem perder qualquer beleza que possa passar á nossa frente. A verdade é que se cultivássemos melhores sentimentos por aquilo que nos é estranho, talvez soubéssemos enxergar melhor aquilo que é realmente válido : aquilo que mora dentro de todos, e que dura por toda a nossa existência, aquela certeza que não somos imunes á nada e que a nossa vida é frágil e que deveríamos cuidar muito bem dela. Essa deveria ser a  nossa resolução interna, que nos faria ser o que somos e definiria a verdadeira beleza ou fraqueza dentro de nós.
Passar por um golpe do destino não é motivo de redenção para ninguém. Porém saber aceita-lo com paciência é demonstração de que a alma permanece intacta, se tornando grandiosa e bela. É a construção de uma beleza que é única, e eterna. Diferente da aparência, que é totalmente descartável e finita.
O outono é para mim muito mais do que uma estação passível de rejeição. Ele significa renovação, é quando as folhas caem , para que no lugar dela possam vir novos frutos e folhas que tornam a vida mais saudável e colorida. A primavera só poderá existir se antes proceder um outono e um inverno rigoroso. Só há transformação, com renovação. E a renovação nem sempre é pintada nas cores que mais nos agradam.
Por isso , acredito que devemos aceitar todas as mensagens que nos são colocadas,valorizar aquilo que realmente importa e principalmente :não buscar, nessa vida, enxergar as pessoas através do véu inconsciente das aparências, mais sim por meio daquilo que elas possuem internamente.

Meu pequeno desabafo, pelos eternos 10 meses de rejeição que sofri por ser uma mensagem descarada da intermitência da vida.



2 comentários:

  1. Mais uma vez você foi brilhante ao expressar sua opinião. Lindo texto. Bj

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  2. Olá Lívia

    Gostei muito do seu texto e também do seu blog. Fui aluno de sua mãe e sempre lembro dela com muito carinho, talvez ela nem lembre mais de mim, pois perdemos contato. Quero que saiba que vou torcer por ti, e peço que todas as boas energias do universo estejam te iluminando nesta luta. Grande e forte Abraço!

    Diego da Luz @diegodaluz2

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