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segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Minha história é tão inacreditável que de tudo isso que vou contar só tiro uma certeza : nada é por acaso.
Sempre fui mais emoção do que razão, isso não posso negar, mas esse ano foi o que mais me mostrou isso. Sinto que para todas as pessoas que passaram na minha vida e por um motivo ou outro quiseram me deixar, ou simplesmente acabaram indo embora eu sempre dei um jeito de deixar algo de bom marcado, seja por palavras ou por esse meu sorriso meio desproporcional ao meu rosto. Sempre acreditei que já que estamos aqui, porque não fazer o bem? Porque não deixar de espalhá-lo, nem que seja da maneira mais simples possível? Esse é o pensamento da Lívia, sempre foi e sempre vai ser.
Minha história diante à esse diagnóstico começa antes mesmo de eu saber que aqui dentro habitavam algumas célulazinhas ruins que estavam se multiplicando de forma inadequada. Sinto que todo o meu “start” começou com a perda da minha querida Tia Marilda( dona do pensionato em que eu morava lá em Belo Horizonte, onde cursava Medicina na UNIFENAS-BH), que com certeza mudou muita coisa na minha vida. Ela despertou muito meu lado “espiritual” e a perda dela foi uma forma de concretizar certas crenças que pra mim careciam de uma explicação mais sólida. Sua perda não me deixou com tristeza, mais sim com uma certeza  de que daqui um bom tempo nós vamos estar juntas de novo , em um lugar maravilhoso, porque eu sei que ela é uma daquelas pessoas definitivas nessa e em outras vidas que eu venha a ter.Foi  nesse despertar que várias coisas começaram a pipocar na minha cabeça em questão de semanas : se era Medicina que eu queria mesmo pra minha vida, se valeria a pena todo o sacrifício de ficar tão longe da minha família, se eu queria de fato ser independente ( de todas as formas possíveis) e principalmente : se aquele meu velho pensamento de querer “salvar o mundo” valeria a pena mesmo, se não era uma bobagem infundada. Passaram-se muitos dias depois da morte da Tia, até que me peguei num quarto escuro, chorando porque cheguei a pequena conclusão que há muitos anos atrás Sócrates também havia chegado :de que eu nada sabia . Chegar a essa conclusão e admitir para si mesmo que nós não sabemos e nunca vamos saber de tudo é muito difícil, ainda mais se for admitido com sinceridade da alma, assim como foi no meu caso . Admiti isso para mim mesma, e me vi na situação de escolher entre continuar algo que para mim naquele momento não fazia sentido ou voltar para um estado de busca de conhecimento (conhecimento de todos os tipos, principalmente auto-conhecimento). E foi com essa justificativa meio maluca( pelo menos foi o que pareceu para todos) que eu pedi para voltar pra minha casa, em Curitiba. Em fevereiro desse ano voltei pra cá e com certeza foi a escolha mais certa que já fiz em toda a minha vida, até agora. Em março tive uma crise de apendicite, operei, e desde lá meu corpo já vinha demonstrando sinais de fraqueza : vivia desmaiando , não tinha vontade de comer nada e era branca como um fantasma. Porém minha cabeça parecia que já estava se preparando para enfrentar tudo isso : livros sobre saúde e doença tomavam minha escrivaninha e ler o relato de como pacientes lidavam com suas doenças era fascinante pra mim. Passava dias lendo-os e tentando buscar na cultura (cinema, fotografia, artes) uma sensibilidade a mais pra o que estava me esperando( que na verdade eu pensava que fosse continuar meu curso).
Os dias foram passando , e tudo começou a funcionar como uma grande despedida pra mim .Queria reunir meus amigos, fazer festas surpresas, ir viajar para visitá-los, dormir junto com quem nem imaginava que pudesse estar ao meu lado um dia...tudo isso só para dizer adeus para alguma coisa que eu pensava que não sabia o que era, mas sabia. O mês de maio se passou exatamente assim, em clima de despedida, clima de alguém que nunca mais ia voltar a ser a mesma que encontrava ali naqueles momentos. Na manhã do dia 18 de maio, acordei com uma dor abdominal terrível e aí começaram as internações: primeiro na Santa Casa, e foi lá que acabei fazendo o exame da medula, para descartar Leucemia (porque meu principal sintoma era queda de hemácias, leucócitos e plaquetas) ...e foi na certa. Um dia depois do exame me encontrava em uma cama, com meus pais e minha médica em volta, e esta me falando que havia avaliado minha lâmina, e nela haviam aparecido uns tais de blastos e que caracterizava um tipo de leucemia.
-  Lívia, você tem Leucemia Linfóide Aguda. O tratamento vai de 2 à 5 anos e você tem que começar a partir de agora. Você vai começar a fazer quimioterapia, e vai ser transferida para outro hospital, o que pode ser feito hoje mesmo. Meu coração fica partido de te dar essa notícia, mais temos exemplos de pessoas muito fortes que conseguiram superar isso e hoje vivem uma vida normal como se nunca tivessem passado por isto.
Foi o que me disse minha querida médica Jerusa. Com essas palavras, ditas de maneira tão triste, que eu só olhei para o lado e vi meus pais e meu irmão desabarem. Seu olhar de desespero diante algo tão brutal cortou meu coração, mas também me encheu de coragem para enfrentar tudo isso : eu precisava ganhar essa batalha, por eles...por mim. A morte tinha vindo me dar um alô e naquele dia eu decidi dizer pra ela que ainda não era a hora, que eu precisava, eu tinha que viver muito mais do que eu já tinha vivido até aquele momento. Fui internada no dia 20 ( 3 dias antes do meu aniversário de 19 anos ) no Hospital Nossa Senhora das Graças, e aqui tenho com certeza a melhor equipe que eu poderia ter no Brasil inteiro, ao meu dispor. Acredito em todos e sei que são capazes de me fazer sair dessa, não apenas com remédios, mais também com toda a atenção e cuidado que um paciente no meu estado necessita.
Aprendo todos os dias com essa equipe maravilhosa, e sei que o dia que em que eu estiver trabalhando como eles, eu vou ser diferente... porque sei exatamente como agir com aqueles que mais precisam.
Hoje, com 3 meses de tratamento vejo o quanto tudo isso precisava acontecer, não por mim, porque parecia que eu já sabia de tudo... mas por todos que estão ao meu redor. Eu sou um instrumento de condução dessa coisa que seja chama esperança, e minha missão é apenas passá-la à quem quiser se aproximar.
Eu não sou doente, eu estou doente... e é nessa pequena diferença que as pessoas que convivem com pessoas que tenham qualquer tipo de doença, ou até os doentes devem pensar. O estado de enfermidade é algo passageiro se temos consciência de como lidar com ele, e é com esse pensamento que tenho me mantido firme e esperançosa por todos esses meses.
Quero poder compartilhar essa minha luta e todas as minhas causas já pré-existentes com todos aqueles que queiram um pouco mais de esperança e luz em suas vidas, por isso escrevo minha história: para provar que tudo nessa vida tem sim um “porquê” , por mais que no começo muitas vezes ele não fique claro. Se passo por tudo isso hoje é porque tenho forças para isso, e eu sei que isso não aconteceu por um acaso.
Acreditem, a princesa sabe que tem muitas coisas que deve fazer sozinha, e nunca precisou de alguém para lhe deixar isto claro.

6 comentários:

  1. Olá Lívia! Muito lindo seu texto e eu admiro muito sua luta. Tenho acompanhado seus textos via facebook e os acompanharei por aqui também. Quanto ao blog, caso precise de alguma ajuda com o layout, instalação de aplicativos e coisas a mais para o blog é só falar! ^^

    Beijinhos,
    Barbara Fiedler.

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  2. Muito lindo, Lívia! Força, fofa!!

    <3 Mandi!

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  3. Lívia, que este seu poder de transmitir sentimentos bons, paz, força possa através deste blog ajudar muitas pessoas. Eu gosto muito de ler tudo que vc escreve. Sinto que os meus problemas se tornam pequenos e que a cada dia devo procurar ser uma pessoa melhor e mais espiritualizada. Beijus
    Perpétua

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  4. minha linda querida !!! não pude deixar de derramar muitas lágrimas lendo seu texto. primeiro de saudades da minha mãe e depois de vc. Queria estar mais perto e poder alimentar essas sua esperança pois concordo contigo em muitas coisas. Sei de perto um pouco da sua história e digo algo pra enriquece-la: voce foi (ou melhor é) uma pessoa muito especial na vida da minha mãe também. Ela sempre a admirou, sempre teve um carinho enorme por voce. Seu carinho e atenção para com ela (até o final) serão inesquecíveis para nós e também por isso peço a Deus com toda a minha fé, que te abençõe e te ampare neste momento. Conte sempre comigo e com essa sua família daqui, a sementinha de amor, amizade, carinho e compaixão que vc plantou em nossos corações só cresce a cada dia. Um grande beijo. Maguinha

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  5. Linda Guerreira...
    Nada poderia ser mais você...
    Muito bom e coisas muito boas te esperam!!!

    Beijos no seu coração

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